Na visão do Banco Mundial, que mede anualmente a evolução da inclusão financeira no mundo, por meio do seu Global Findex, ter uma conta que permita aos adultos guardar dinheiro e realizar pagamentos é fundamental para a erradicação da pobreza, e que o maior acesso ao sistema financeiro pode, por exemplo, impulsionar a criação de empregos e aumentar os investimentos em educação.
Estima-se que no Brasil, segundo dados do IBGE, aproximadamente 42% da população adulta, com idade acima de 18 anos, não possuem conta em banco. Se pensarmos no mundo dos negócios, é possível perceber de forma nítida o insatisfatório acesso dos microempreendedores individuais e empresas de pequeno porte a crédito e outros serviços financeiros. Se pensarmos então nos negócios informais, que possuem estatísticas expressivas no nosso país, esse acesso inexiste, pelo menos dentro de seu contexto mais tradicional.
Ao que parece, novas tecnologias aliadas a novos modelos de negócios, encontraram uma alternativa com potencial de subverter toda a lógica do acesso a serviços financeiros e riscar de vez do mapa o termo “desbancarizados”.
Nesse caso estamos falando das Fintechs (financial technology). As fintechs surgiram no rastro de inovações e avanços na tecnologia da informação, como Cloud Computing, Big Data, Mobile, dentre outras, além de terem percebido que havia um público que não era atendido pelos bancos. Eram pessoas ou empresas que não consumiam serviços financeiros. Por não terem histórico, também não tinham acesso a crédito, ou simplesmente tinham restrição a acessarem estes e outros serviços.
Mas não é só isso, elas parecem ter captado também as questões que tem balizado o perfil geral dos novos consumidores e que tendem a se manter e aprofundar. Como comodidade, por exemplo, para que nos preocuparmos com o horário de abertura e fechamento dos bancos tradicionais, quando podemos ter acesso e atendimento a qualquer hora? Além de ter disponível uma miríade de canais para contatos, como por exemplo, chat, e-mail, redes sociais, telefone, etc. Ou economicidade; quando pensamos se faz sentido pagar o nível de taxas cobradas atualmente pelas instituições financeiras tradicionais.
Por que estar sujeito a uma análise parcial baseada em dados dos serviços de informação para crédito e de seu histórico de relacionamento com instituições financeiras, quando tem a sua disposição a análise de diversas bases de dados, além das fontes já tradicionais, assim como das mídias sociais, como o Facebook, e sites de comércio eletrônico, por exemplo, com ferramentas capazes de cruzar milhares de dados e informações sobre uma determinada pessoa ou empresa, aprovando ou não sua solicitação de crédito, em apenas alguns minutos?
E quando temos contato com notícias como a da venda do smartphone indiano de quatro dólares, ou do smartphone da Amazon por US$ 50,00 (o aparelho se chama Blu R1 HD e leva junto consigo na tela de bloqueio, um rodízio de anúncios); e a expansão cada vez maior do número de acessos à internet, os dois pontos fundamentais nos quais está apoiado o modelo de negócios das Fintechs, podemos perceber que o seu grau de expansão e atendimento é exponencial, possuindo portanto todas as condições de abarcar pessoas e pequenos empreendimentos, que possivelmente nunca teriam acesso a serviços financeiros pelos canais tradicionais.
Pensando nesse contexto, a equipe da Nous SenseMaking realizou um levantamento que objetivou identificar as Fintechs existentes no Brasil. Para isso criou um banco de dados de todas as Fintechs do Brasil, a partir das informações das instituições representativas dessas organizações, além de buscas por notícias relacionadas ao tema, dentre outras fontes, concatenando informações como nome, segmento de atuação, tempo de abertura e etc, para entender como está estruturado esse novo segmento de mercado no Brasil. Vale destacar que, como é um mercado caracterizado por startups, esse número pode sofrer alterações em um curto espaço de tempo. Como referência, o trabalho de levantamento de informações sobre as Fintechs foi realizado no período de 18 a 29 de julho de 2016.
Ao todo existem 168 Fintechs no Brasil, para 12 delas não foi possível localizar o estado em que foram registradas, relativo ao conjunto restante, a esmagadora maioria delas, 88%, tem como sede os Estados do Sudeste do Brasil, estando 66% registradas em SP, 12% no Rio de Janeiro, 9% em Minas Gerais e 1% no Espírito Santo. Os Estados da Região Sul, aparecem como a segunda mais representativa, onde temos Santa Cataria, com 3% das empresas registradas, seguida do Rio Grande do Sul e Paraná, com 2% respectivamente.
Apesar de sua concentração no Sudeste e Sul, no seu conjunto elas possuem sede em 12 estados brasileiros, ou seja, em 44% do total de estados (26 estados mais o Distrito Federal): MG, SP, RJ, ES – Sudeste; SC, PR, RS – Sul; SE, CE, AL – Nordeste; GO – Centro Oeste e DF. E nesse cenário surge o destaque da Região Nordeste, com a terceira região com maior presença de estados que tem registrado uma fintech.
Apesar de ser um setor relativamente novo no Brasil e no mundo, externamente alguns países como os EUA já possuem maior maturidade no setor. E o interesse de atuação dessas Fintechs estrangeiras no Brasil, já pode ser notada, cerca de 5,4% em atuação por aqui, tem origem em outros países, como África do Sul, Alemanha, EUA, França, Luxemburgo e Polônia.
A maioria (aqui utilizamos a segmentação proposta pela FintechLab) dessas 168 empresas atuam no segmento de Pagamentos (34%), seguido pelos segmentos de gerenciamento financeiro (18%) e empréstimos e negociação de dívidas (14%). O segmento menos expressivo no Brasil, por enquanto, é o de Bitcoin e Blockchain, com 3% das empresas. Apesar dessa tímida presença, é justamente nas empresas de Blockchain, que se esperam os maiores impactos no futuro dos bancos, mas também em outras frentes e negócios, como por exemplo, os serviços cartoriais.
Ao considerarmos o tempo de abertura dessas empresas, constata-se que aproximadamente 60% deles iniciaram suas atividades a partir de 2012, sendo o ano de 2013 o ano de maior abertura desse tipo de organização, quando foram registradas a abertura de 20% de todas as Fintechs existentes no Brasil. Um dos fatos que mais chamam atenção é que, apesar de jovens, são empresas que tem captado um considerável volume de recursos, não apenas de bancos e de fundos de investimento, mas também de setores não concorrentes de bancos ou seguradoras, como empresas fornecedoras de tecnologia, comércio eletrônico, de telecomunicações, fornecedores de infraestrutura, dentre outros.
Uma questão relevante é que a maioria das Fintechs no Brasil não se caracteriza como uma atividade financeira, de seguros e serviços relacionados. As 168 Fintechs identificadas estão divididas em 38 atividades principais distintas, estando apenas 12 delas classificadas como atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados. Isso pode explicar por que em sua maioria elas não se encontram sob a regulamentação do nosso Banco Central. Quando analisadas suas respectivas classificações principais de atividade (CNAE – Classificação Nacional de Atividades Econômicas), verifica-se que 9,5% estão classificadas como “desenvolvimento e licenciamento de programas de computador customizáveis”, 7,1%, “desenvolvimento e programas de computador sob encomenda” e 6,5% como “portais, provedores de conteúdo e outros serviços de informação na internet”. Com isso elas conseguem avançar no mercado de uma forma sutil, rápida, e sem muita condição de agrupamento, pelo menos no contexto das classificações oficiais de atividades econômicas, se constituindo um poderoso player ainda sem forma e de difícil de identificação.